Hanoch Levin – o autor




Nascido em 18 de dezembro de 1943, Hanoch Levin é filho de emigrantes poloneses sobreviventes do Holocausto. Com a morte prematura do pai, logo cedo teve que trabalhar e passou a juventude nas áreas pobres de Tel Aviv. Depois do serviço militar obrigatório, decide estudar Filosofia e Literatura Hebraica na Universidade de Tel Aviv e, na década de 60, escreve poemas, contos e uma peça radiofônica, além de numerosos artigos para jornais estudantis.

Seu talento de escritor já chamava a atenção dos editores, o que o animou a se aproximar de uma companhia teatral e escrever esquetes de humor negro apresentados sob a forma de cabaré. Depois de um período de peças cáusticas, sua escrita afiada e impiedosa se volta para temas míticos, obras envoltas numa aura de mistério e de lirismo. Como não podia deixar de ser num artista engajado explicitamente com seu mundo, a morte e a violência são personagens recorrentes, utilizados para denunciar a arbitrariedade, a intolerância e o autoritarismo.

Trabalhador incansável e um dos mais importantes escritores israelenses, Levin publicou peças, esquetes, romances, poesia e canções. Sua obra teatral constitui-se de 63 peças, das quais vinte ainda permanecem inéditas. Além de escritor foi também diretor de 22 de suas peças, função que desempenhava também com rigor e ousadia. Hanoch Levin morreu em 18 de agosto de 1999, vítima de um câncer depois de longa agonia. Ao contrário de muitos autores, Levin não deixou para trás gavetas cheias de material. Nos últimos anos de sua vida, foram publicados 17 volumes de seu trabalho: 11 volumes de peças teatrais, 3 de prosa, 2 de pequenas cenas e canções e um volume de poemas. Há ainda dois volumes de livros para crianças.

Réquiem é uma de suas últimas peças e foi dirigida pelo autor do leito do hospital. A encenação feita para o Teatro Cameri – uma das mais importantes companhias do teatro israelense - permanece até hoje no repertório, tendo recebido inúmeros prêmios e apresentada nos mais importantes festivais do mundo e em constantes excursões pelo Oriente e pelo Ocidente.

No início da carreira, Hanoch Levin não hesitou em criar obras em que satirizava a sociedade: seu ímpeto era tamanho que provocou celeuma e chegou a ser renegado pelo público. Uma de suas criações deste período, “a Rainha da Banheira” foi proibida depois de 18 sessões. Apesar das dificuldades, a crítica especializada jamais deixou de reconhecer seu talento.

Com o passar dos anos, sua visão arguta e seu talento se impuseram ao público. Levin é hoje considerado o Tchékhov, ou o Beckett , ou o Shakespeare do teatro de Israel.
Por que comparado a autores tão díspares?

Exatamente porque, como criador, Levin se aventura com grande destemor por diferentes estilos e, com grande sensibilidade, delineia contornos paradoxais do ser humano, como também mergulha na mais deslavada paródia sem esquecer-se de percorrer os labirintos metafísicos da alma humana. Opressores e oprimidos, fortes e fracos, visionários e incrédulos, seus personagens estão quase sempre em confronto aberto, usados como veículos para uma crítica áspera à burguesia.

A exuberância de suas obras contrasta com seu temperamento discreto, sem atração pelas luzes da mídia. Hanoch Levin concedeu pouquíssimas entrevistas em seus mais de 30 anos de trabalho ininterrupto, e dizia sempre que suas obras já falavam tudo que tinha a dizer. Esta timidez contrasta com a eloqüência de seus personagens que nunca poupam nada nem ninguém quando manifestam suas opiniões a respeito do homem e da vida.

Revisor obstinado de seus escritos, como encenador Levin era visto com freqüência nas últimas fileiras da platéia assistindo e tentando convencer os intérpretes a se manterem abertos a permanentes reformulações. Agarrado à vida com unhas e dentes, Levin ensaiava até a última sessão de uma temporada, assim como se manteve em atividade até quase o último suspiro.

Hanoch Levin é referência obrigatória no panorama teatral e literário de Israel, reconhecido mundialmente como um dos artistas mais inquietantes da literatura e da cena contemporâneas. No Brasil é quase completamente desconhecido. Em 2008, o público paulista teve a oportunidade de conhecer duas de suas obras em leituras dramáticas programadas pelo Centro da Cultura Judaica, com a curadoria de Silvana Garcia: Murder, que trata do conflito árabe-israelense, e, mais recentemente, o próprio Réquiem. Mesmo no formato de leituras dramáticas, pela reação do público foi possível avaliar o alto poder de afetação do teatro de Hanoch Levin. E agora, em 2009, dez anos após sua morte, o público brasileiro tem a oportunidade de assistir à primeira encenação de uma obra de Levin em solo nacional.